Por que mãe atípica não pode ser apenas mãe?

por Mônica Pitanga / Ilustração Paloma Santos

Quando minha primeira filha nasceu eu ganhei um “anexo” na maternidade: Mãe atípica.
Sou chamada assim por ter uma filha que tem uma doença rara e é uma pessoa com deficiência.
Esse nome “maternidade atípica” é sobre o lugar social que eu ocupo, por ter uma filha que é atravessada pela negação, pelo preconceito e pela invisibilidade.

Somos um grupo de mães que recebem junto ao diagnóstico, uma sentença de que a vida não vai ser boa a partir dali. Temos que lidar com o medo, com a discriminação, julgamentos e solidão. O capacitismo – que é o preconceito e discriminação que as pessoas com deficiência sofrem – é estrutural e assim como o racismo, vem sendo construído ao longo da história. É ele Que faz com que as pessoas olhem pra minha filha, sintam pena e pensem que ela é uma coitadinha, um anjo especial ou exemplo de superação.

É porque as pessoas olham pra minha filha como um fardo, um problema ou uma cruz difícil de carregar, que me chamam de guerreira e admiram a super mãe que eu sou . Será ?! Mas… o que é ser uma boa mãe ou uma mãe especial ?

As vezes eu não me acho uma boa mãe. Tem dias que não dou conta sozinha e preciso pedir ajuda. Em outros, tenho vontade de chorar e preciso respeitar a minha dor. Tem dias que erro e me sinto péssima.

Sou humana !

A ideia de que a minha maternidade é divina e que Deus me escolheu para enviar um “anjo especial” é capacitista!
A minha maternidade atípica é vista como heróica porque tenho que lutar diariamente pelos direitos da minha filha e porque não existem políticas públicas que amparem quem cuida.

Mas a verdade, é que esse lugar de guerreira ou heroína cansa! Eu queria poder ser apenas MÃE.

A mãe atípica muitas vezes, sabe mais da doença do filho do que o próprio médico. Ela é terapeuta, psicóloga, professora, enfermeira, advogada … São tantas funções!
Você já parou para pensar que mãe atípica não pode morrer ? Pois se ela morrer, quem é que vai cuidar do filho ou filha que demanda tantos cuidados ?
Não podemos descansar e nem desistir!

Na maternidade atípica muitas vezes ouvimos: “Deus não dá a cruz maior do que pode carregar” ou : “tinha que ser. Essa é a sua missão.” Não concordo!
Eu sempre digo que meus cinco filhos me transformaram. Com eles, eu aprendi muito sobre quem eu sou hoje. Lá se vão 20 anos sendo mãe e as transformações, continuam acontecendo. Acho que isso faz parte do existir.

Em cada livro que leio, em cada curso que faço , em cada palestra que dou, em cada pessoa que conheço, sigo aprendendo e me transformando.
A maternidade atípica, foi o ponto de partida de muitas coisas que sou e faço hoje. Foi nesse lugar que aprendi que o lugar de desconforto, também pode ser uma lugar de expansão e que a mudança que queremos no mundo, tem que partir da gente.

Hoje meu trabalho é combater ideias e preconceitos através da educação.
A minha maternidade é política e a sua também.

Nós somos responsáveis por criar seres humanos do futuro e isso pode ser potente e revolucionário.
Feliz dia das mães

Mônica Pitanga é mãe de cinco filhos, casada há 22 anos. É palestrante, escritora e colunista do site Canguru News onde escreve sobre a maternidade atípica. Fundou em 2019 uma ONG em Cachoeiro de Itapemirim-ES, que luta por acessibilidade e inclusão das pessoas com deficiência, onde realiza um trabalho voluntário.

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